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O Seguro de Crédito e a incerteza dos mercados

25.11.2022
O Seguro de Crédito e a incerteza dos mercados
Os últimos anos têm sido, sem dúvida, atípicos, não só pelas questões já muito faladas sobre o impacto da pandemia, mas também pelos acontecimentos dos últimos meses, como a Guerra na Ucrânia, que parece não ter fim à vista, e que faz com que os mercados estejam muitíssimo apreensivos face ao futuro a curto e a médio prazo.  
 
Entre estes fatores de apreensão estão os crescentes constrangimentos no acesso às matérias-primas agrícolas, às fontes de energia (principalmente com o inverno na Europa a chegar em força nos próximos meses) e também porque não existe nenhuma guerra da era moderna que tenha terminado com um vencedor, mas sim, todas elas foram solucionadas com base no diálogo e em acordos, o que não se vê possível neste momento por parte da Rússia. 
 
Se há variável que a economia não gosta é a da incerteza, e é exatamente esse o momento que estamos a viver. Esta incerteza económica traz consigo um velha e conhecida "amiga” que é a prudência, e estas duas variáveis fazem com que a agitação nos mercados monetários se mantenha a níveis idênticos aos da última grande crise, mas com uma enorme diferença: a rapidez com que se instalou. 
 
Após um período de dois anos com taxas de sinistralidade dos incumprimentos nos pagamentos das transações entre empresas aos níveis mais baixos registados na história do seguro de crédito, estamos neste momento perante um cenário em que se verifica totalmente oposto. 

 
Desde o início de 2022 que os mercados, ainda impulsionados pelos dois anos anteriores, não paravam de crescer, verificando-se constantes aumentos dos volumes de vendas das empresas, na maioria dos casos devido ao aumento dos custos das matérias-primas e, consequentemente, dos produtos finais. Verificávamos com isto um crescimento constante das contas correntes dos clientes que forçavam a consecutivos aumentos de limites de crédito atribuídos pelas seguradoras de crédito. 

 
Apesar de, desde o início do ano se assistir a um crescimento significativo da sinistralidade, o pós-férias veio confirmar o esperado, com um aumento ainda mais significativo dos atrasos e consequentemente dos sinistros comunicados às seguradoras. Estes sinistros têm agora montantes cada vez mais elevados, visto que as seguradoras haviam aumentado, em muito, as suas exposições face ao risco de crédito, para irem ao encontro das necessidades dos segurados, e assim permitir que as empresas pudessem exportar mais e também” alimentar” para o mercado interno. 
 
No decorrer da nossa atividade temos assistido a um contexto de apreensão generalizada, uma vez que se tem verificado uma diminuição significativa de encomendas em vários setores de atividade, sendo um dos mais preocupantes neste momento o que diz respeito à diminuição generalizada no setor transportador, porque é um dos "barómetros” das nossas exportações e fundamental para o equilíbrio da economia portuguesa. 

 
Perante isto, verificamos um novo desafio para o mercado do seguro de crédito onde, uma vez mais, o correto aconselhamento e apoio de um corretor vai fazer toda a diferença. As consecutivas vigências com baixa sinistralidade forçaram a redução das taxas de prémio e consequentemente dos prémios das apólices, porém a capacidade de indemnização destas varia no mesmo sentido do prémio, uma vez que a generalidade das seguradoras utiliza limites máximos de indeminização anual de 25 a 30 vezes o prémio anual pago da apólice. 
 
Estamos atualmente perante um aumento de sinistralidade (quer verificada, quer esperada), contas correntes dos clientes com valores cada vez mais elevados e apólices com prémios cada vez mais baixos. A junção destes fatores faz com que as empresas corram neste momento o risco de atingir muito facilmente o limite máximo de indemnização anual da apólice, podendo não conseguir desta forma ver indemnizados todos os créditos de curto prazo que concederam aos seus clientes. 
 
Para tal, é fundamental realizar um trabalho exaustivo não só aos limites de crédito, mas também aos limites máximos de indemnização anual das apólices. 

 
Tenho a certeza de que os diretores financeiros, e em particular os empresários/acionistas (pois é a estes que o incumprimento dos seus clientes afeta) estão atentos aos sinais do mercado, e sabem que existe no seguro de crédito uma mais-valia não só de indemnização num cenário de incumprimento, mas também uma fonte de informação das alterações da saúde financeira das empresas, para além de um importante apoio durante todo o processo de recuperação da dívida. 
 

Se os últimos anos foram, sem dúvida, atípicos, o próximo não será muito diferente, pelo que é fundamental (para não dizer mesmo obrigatório) que exista por parte das empresas uma correta salvaguarda do risco de crédito concedido (leia-se concessão de crédito), para que num cenário de incumprimento o tecido empresarial não sofra ainda mais com o número de insolvências. 

 

Por Marcos Polónia, Diretor de Crédito e Caução da MDS Portugal 
Publicado no jornal Vida Económica