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“Saúde mental tem fraco investimento”

16.10.2020
“Saúde mental tem fraco investimento”

Os seguros oferecem uma cobertura reduzida ao nível da saúde mental, afirma Ana Mota, diretora de Employee Benefits do broker MDS Portugal. O setor segurador tem uma abordagem pouco profunda do tema, porque existe uma prevalência grande deste tipo de doenças na população que degeneram em doenças crónicas, diz a mesma gestora. Realça que os tratamentos tendem a ser dispendiosos, para além de que "existe uma oferta privada de cuidados de saúde muito restrita, "diminuindo a possibilidade de acordos que permitam a sua inclusão nos Planos de Seguro de Saúde sem aumentar de forma insustentável os preços”. 

Por seu lado, Filipa Palha, da Encontrar+Se, sublinha que o impacto da pandemia no agravamento do problema "é imenso”. Adianta que "a saúde mental é uma área da saúde há muito fragilizada, com fraco investimento e graves lacunas em termos de prevenção, acesso a cuidados e disponibilização de serviços adequados. O sofrimento causado pela pandemia, seja pelo impacto das mortes, do medo e da incerteza que se instalou nas nossas vidas, seja pela alteração nas relações sociais, consequências no desemprego e crise económica, não só resultou no aumento dos problemas de saúde mental, como agravou a situação de muitas pessoas que já viviam com um problema desta natureza. Não é por acaso que, num tão curto espaço de tempo, se ouviu falar tanto de saúde mental”. 

Questionada sobre a sustentabilidade do sistema de seguros de saúde, Ana Mota frisa que "a sustentabilidade estará, como sempre, dependente do binómio prémios versus custos com despesas médicas. À medida que se alarga o âmbito de coberturas é inevitável que o preço dos seguros suba, mas esta subida dependerá também do grau de dispersão do risco, ou seja, do número de pessoas seguras, e do valor total das despesas médicas”.

 E sobre literacia financeira, diz Ana Mota que, "apesar de existirem consumidores informados, a questão da iliteracia financeira é algo a que todos nós, profissionais de seguros, temos de estar atentos, procurando combatê-la de uma forma ativa. Se todos contribuírem para um vel evitar falsas expetativas e promover uma utilização responsável dos seguros de saúde”. E, por último, questionada sobre parcerias seguros privados/Estado, frisa: "Antes de mais, o SNS deveria ter capacidade de disponibilizar o acesso atempado a boas práticas para problemas de saúde mental. Independentemente da gravidade de algumas situações, a verdade é que se fosse possível garantir uma intervenção precoce, com práticas baseadas na evidência, era certo que o potencial de recuperação não seria comprometido e a gravidade a que tantas situações chegam poderia ser evitada. Se o SNS reconhece a sua incapacidade de garantir o direito à saúde nesta área, então torna-se necessário pensar alternativas, como os seguros. 

Cada vez mais temos de reconhecer que o "Estado” não tem capacidade de acudir a todos os desafios sociais com que nos deparamos. Seria desejável que ao longo do nosso desenvolvimento, da nossa formação como "pessoas”, se interiorizasse de forma natural a responsabilidade, importância e papel que temos no nosso ecossistema. Não só permitiria estarmos atentos e disponíveis para contribuir, como seria uma fonte de satisfação. Quero acreditar que é possível”.



Entrevista Ana Mota, diretora de Employee Benefits da MDS Portugal e Filipa Palha, Presidente da ENCONTRAR+SE - Associação para a Promoção da Saúde Mental
Publicado no Jornal Económico, Suplemento Mais Seguro