“Saúde mental tem fraco investimento”
Os seguros oferecem uma cobertura reduzida ao nível da saúde mental, afirma Ana Mota, diretora de Employee Benefits do broker MDS Portugal. O setor segurador tem uma abordagem pouco profunda do tema, porque existe uma prevalência grande deste tipo de doenças na população que degeneram em doenças crónicas, diz a mesma gestora. Realça que os tratamentos tendem a ser dispendiosos, para além de que "existe uma oferta privada de cuidados de saúde muito restrita, "diminuindo a possibilidade de acordos que permitam a sua inclusão nos Planos de Seguro de Saúde sem aumentar de forma insustentável os preços”.
Por seu lado, Filipa Palha, da Encontrar+Se, sublinha que o impacto da pandemia no agravamento do problema "é imenso”. Adianta que "a saúde mental é uma área da saúde há muito fragilizada, com fraco investimento e graves lacunas em termos de prevenção, acesso a cuidados e disponibilização de serviços adequados. O sofrimento causado pela pandemia, seja pelo impacto das mortes, do medo e da incerteza que se instalou nas nossas vidas, seja pela alteração nas relações sociais, consequências no desemprego e crise económica, não só resultou no aumento dos problemas de saúde mental, como agravou a situação de muitas pessoas que já viviam com um problema desta natureza. Não é por acaso que, num tão curto espaço de tempo, se ouviu falar tanto de saúde mental”.
Questionada sobre a sustentabilidade do sistema de seguros de saúde, Ana Mota frisa que "a sustentabilidade estará, como sempre, dependente do binómio prémios versus custos com despesas médicas. À medida que se alarga o âmbito de coberturas é inevitável que o preço dos seguros suba, mas esta subida dependerá também do grau de dispersão do risco, ou seja, do número de pessoas seguras, e do valor total das despesas médicas”.
E sobre literacia financeira, diz Ana Mota que, "apesar de existirem consumidores informados, a questão da iliteracia financeira é algo a que todos nós, profissionais de seguros, temos de estar atentos, procurando combatê-la de uma forma ativa. Se todos contribuírem para um vel evitar falsas expetativas e promover uma utilização responsável dos seguros de saúde”. E, por último, questionada sobre parcerias seguros privados/Estado, frisa: "Antes de mais, o SNS deveria ter capacidade de disponibilizar o acesso atempado a boas práticas para problemas de saúde mental. Independentemente da gravidade de algumas situações, a verdade é que se fosse possível garantir uma intervenção precoce, com práticas baseadas na evidência, era certo que o potencial de recuperação não seria comprometido e a gravidade a que tantas situações chegam poderia ser evitada. Se o SNS reconhece a sua incapacidade de garantir o direito à saúde nesta área, então torna-se necessário pensar alternativas, como os seguros.
Cada vez mais temos de reconhecer que o "Estado” não tem capacidade de acudir a todos os desafios sociais com que nos deparamos. Seria desejável que ao longo do nosso desenvolvimento, da nossa formação como "pessoas”, se interiorizasse de forma natural a responsabilidade, importância e papel que temos no nosso ecossistema. Não só permitiria estarmos atentos e disponíveis para contribuir, como seria uma fonte de satisfação. Quero acreditar que é possível”.
Entrevista Ana Mota, diretora de Employee Benefits da MDS Portugal e Filipa Palha, Presidente da ENCONTRAR+SE - Associação para a Promoção da Saúde Mental
Publicado no Jornal Económico, Suplemento Mais Seguro