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O impacto das alterações climáticas nos seguros

16.09.2022
O impacto das alterações climáticas nos seguros
Julho foi o mês em que se registaram as temperaturas mais elevadas dos últimos 92 anos em Portugal e, a nível mundial, foi o terceiro mais quente desde que existem registos! O Reino Unido foi afetado por eventos climáticos que apenas eram expectáveis acontecer em 2040. No norte dos Estados Unidos da América, no Mississípi, ocorreram fortes chuvadas com tal intensidade que usualmente só ocorrem uma vez a cada mil anos, isto é, têm uma probabilidade anual de ocorrência de 0,001%. Mas se a ocorrência de um destes eventos já é algo raro, per si, o que pensar quando os três acontecem na mesma semana, como se verificou recentemente? 

Até os mais céticos ou relutantes em acreditar nas alterações climáticas se rendem cada vez mais às evidências. 

Os principais seguradores e resseguradores a nível mundial são perentórios em concluir que as alterações climáticas são um dos maiores riscos que as sociedades e a economia global enfrentam, ameaçando todo o tipo de empresas, sejam pequenas, médias ou grandes, ao poderem originar impactos físicos, operacionais, financeiros e reputacionais. A boa notícia é que o risco das alterações climáticas (e os seus impactos) é, na sua grande essência, passível de ser transferido para o mercado segurador.   

A maior parte dos seguros de danos patrimoniais disponíveis garantem cobertura para os danos materiais, e consequentes perdas de exploração, causados por fenómenos de natureza, nomeadamente os de índole climática, ou seja, aqueles cuja frequência e severidade tem vindo a aumentar. 

Contudo, até aos dias de hoje estima-se que cerca de três quartos de todas as grandes catástrofes naturais, tais como Sismos ou Furacões, não estavam cobertas por apólices de seguro, pelo que existem expressivas lacunas em matéria de proteção, globalmente exacerbadas pela atual crise com o custo de vida. 

Se tal não bastasse, os seguros tradicionais caracterizam-se por apenas darem origem a indemnizações em caso de manifestações comprovadas de dano material às instalações/bens tangíveis seguros. Por isso, o mercado segurador pode e deve criar novas soluções de seguros que contribuam para o reforço da resiliência da sociedade face aos riscos climáticos.  

Uma destas novas soluções, que na realidade já surgiu há mais uma década, mas só agora os avanços tecnológicos permitiram a sua massificação, são os seguros paramétricos. Estes seguros, que devem ser vistos como um complemento e não um substituto dos seguros ditos tradicionais, garantem a probabilidade de ocorrência de um determinado evento climático, sem que para tal tenham que se verificar danos materiais. Recorrem a um índice ou conjunto de índices pré-determinados e acordados entre segurador e segurado, cujos valores apresentam um "limiar”, o qual uma vez atingido ou ultrapassado dá lugar à indemnização.   

É de realçar que a oferta atual de seguros paramétricos apresenta uma grande flexibilidade e diversidade. Ondas de calor extremo, seca, incêndios florestais, baixo caudal em rios navegáveis, geadas, granizo, insuficiente radiação solar ou menores níveis de vento, são exemplo de coberturas possíveis de contratação.  

Teoricamente, qualquer evento que possa gerar uma perda de exploração para uma organização ou Estado, pode ser garantido por um seguro paramétrico, desde que exista um índice associado. E tal evento pode ocorrer em qualquer ponto do globo, independentemente de onde o segurado desenvolva a sua atividade, ou seja, pode conferir proteção às cadeias logísticas mais remotas ou distantes. Imagine-se o exemplo de uma PME portuguesa que não consegue receber matéria-prima, pois um tufão impede que navios zarpem de um determinado porto asiático, registando assim uma perda de exploração sem que exista dano material em Portugal. Tal pode ser coberto por um seguro paramétrico. 

Todos os dias surgem novas tecnologias que permitem gerar e modelizar novos dados e desenvolver novos índices, o que permitirá ao setor dos seguros paramétricos adaptar-se e adequar-se ao contínuo e crescente impacto das alterações climáticas, estando assim também na primeira linha de ferramentas de mitigação deste risco para contrato de seguro. 

As alterações climáticas e a necessária descarbonização da sociedade obrigarão a indústria seguradora a evoluir e a prosseguir na senda da inovação. Ao longo da história, o seguro existiu para apoiar a inovação, fornecendo proteção contra o risco e o impacto do esforço humano. 


E o corretor, que sempre atuou como um elo entre o consumidor e as seguradoras, está perfeitamente posicionado para desenvolver novas iniciativas e manter a sua posição crítica no mercado. Seja em que direção o ser humano caminhe, o seu corretor de seguros caminhará ao seu lado. 

 

Nuno Rodrigues, Diretor de Riscos Patrimoniais e Engenharias MDS Portugal 
Publicado no Vida Económica, Suplemento Seguros Climáticos e Ambientais