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Quais os impactos da pressão inflacionista e disrupção das cadeias de abastecimento nos seguros?

15.09.2022
Quais os impactos da pressão inflacionista e disrupção das cadeias de abastecimento nos seguros?
A pandemia de Covid-19 causou grandes perturbações nas cadeias logísticas a nível mundial, uma situação que pode demorar alguns anos até ser normalizada. Tal fenómeno, conjugado com o aumento dos custos da energia, das matérias-primas, dos bens alimentares e com a eclosão da guerra na Ucrânia, leva a que se registem níveis de inflação historicamente elevados que ainda não tinham sido verificados neste século. 

Esta expressiva escalada dos preços impacta toda a economia e o setor dos seguros não foge, obviamente, à regra. 

O impacto da pressão inflacionista e da disrupção das cadeias de abastecimento é muito severo e, se não for devidamente acautelado, pode ter consequências graves, especialmente em ambientes económicos difíceis. 

Na realidade, no âmbito dos seguros e na perspetiva dos segurados, as repercussões da pressão inflacionista são diversas e relevantes, desde logo, nos capitais seguros; e, se não forem devidamente acautelados, podem ter graves consequências graves num cenário de sinistro, podendo, inclusivamente, colocar em causa a sustentabilidade e a continuidade dos negócios. 

 
 

Seguros Patrimoniais - o risco de subseguro ou infrasseguro 


A correta determinação do capital seguro é a base essencial para uma boa regularização do sinistro, e uma responsabilidade do tomador do seguro, não só no início do contrato, mas também durante toda a sua vigência. Este aspeto é de vital importância, especialmente em conjunturas económicas difíceis e voláteis como aquela em que atualmente vivemos, com um aumento generalizado dos preços, nomeadamente de materiais e mão-de-obra.  

 
Como determinar corretamente o capital seguro 

No seguro de danos os critérios de determinação do capital seguro relativamente a cada tipo de objeto seguro constam do contrato de seguro r. Tipicamente correspondem: 
  • Imóveis - ao custo de reconstrução do imóvel, tendo em conta o tipo de construção e outros fatores que possam influenciar esse custo, à exceção dos terrenos. Em relação aos imóveis em regime de propriedade horizontal, inclui o valor proporcional das partes comuns.  
  • Mercadorias - estas deverão ser valoradas ao preço corrente de aquisição para o segurado ou, no caso de se tratar de produtos por ele fabricados, ao valor atual dos materiais transformados e/ou incorporados, acrescido de todos os custos de fabrico.  
  • Máquinas e equipamentos - o capital seguro deverá corresponder ao custo em novo do equipamento, deduzido da depreciação inerente ao seu uso e estado. Se tiver sido contratada a cobertura de Valor de Substituição, deverá corresponder ao seu valor de substituição, à data do acidente, por um equipamento novo, de idênticas características e rendimento, acrescido de despesas de frete, montagem e direitos alfandegários. 
  • Mobiliário e recheio - o capital seguro deverá corresponder ao custo de substituição dos bens objeto do contrato, pelo seu valor em novo. 
É no momento do sinistro que o segurador confirma se o capital seguro foi corretamente determinado. É importante sublinhar que, antes deste momento, não existem diligências prévias por parte dos seguradores para validação dos montantes declarados pelo segurado. 

 
Como funciona a regra proporcional  

Num contexto inflacionista existe um maior risco de se verificar uma situação de subseguro (ou infrasseguro) no momento do sinistro, ou seja, do capital seguro se revelar inferior àquele que na realidade está em risco. 

Nesta hipótese a seguradora só é obrigada, por força do contrato e da lei, a assumir os prejuízos na proporção entre o capital seguro e o seu valor real (regra proporcional).  

De acordo com esta regra, o segurador só paga uma parte dos prejuízos, isto é, o valor da indemnização não corresponderá ao valor total dos danos sofridos mas apenas a uma percentagem, correspondente à proporção entre o valor seguro e o valor em risco (determinado de acordo com a regra proporcional). 

Por exemplo, se um edifício cujo custo de reconstrução é de 1.000.000 € estiver seguro por 750.000 €, e tiver sofrido danos parciais no valor de 200.000 € o segurador será responsável apenas por 150.000 €, ou seja, 75% dos prejuízos apurados aquando da peritagem, ficando os restantes 50.000 € (25% dos prejuízos) a cargo do segurado. 

 

A importância da atualização de capitais  

Para que não se verifiquem situações de subseguro ou infrasseguro é necessário que os segurados realizem diligências de revisão e atualização dos capitais seguros tendo por base os preços praticados, nesse período, pelo mercado. 

As apólices de Patrimoniais podem incluir cláusulas que visam acomodar flutuações de capitais em risco relativamente aos capitais seguros, tais como a cláusula de atualização automática do capital seguro no caso de apólices de habitação/condomínio, ou a cláusula de atualização convencionada de capitais, no caso de apólices de patrimoniais de outra tipologia. 

 

Perdas totais e a importância da cláusula de substituição de valor em novo 

Importa referir que o acréscimo dos custos de substituição ou reparação de equipamentos e máquinas também tem outras consequências, nomeadamente amplia o risco de situações de, em caso de sinistro, a reparação ou substituição não ser economicamente justificável por exceder o valor de mercado dos mesmos e, decorrente disso, verificarem-se situações de perda total. Nestes casos, por via de regra, o valor da indemnização de um bem considerado como perda total corresponderá ao valor da sua substituição em novo, deduzido da sua depreciação por uso e desgaste, ou seja, o valor da indemnização não permitirá suportar o custo de aquisição de um novo. Para ultrapassar tal limitação pode ser subscrita uma Cláusula de Substituição de Valor em Novo. 

 

Tempos de reposição e os seguros de perdas de exploração 

Para além das consequências nos preços dos bens e serviços verificam-se outros danos colaterais como sejam os atrasos significativos na produção, distribuição e entrega de materiais e equipamentos, na reconstrução de edifícios, na substituição, reparação e montagens de máquinas e equipamentos.  

Em caso de sinistro, estes atrasos podem traduzir-se em paralisações de atividade e materializar-se em perdas e/ou diminuição de vendas. 

Este difícil contexto logístico reforça mais do que nunca a importância da contratação de coberturas de seguros de perdas de exploração.  

Neste âmbito, é de elevada importância optar-se pela inclusão da cláusula Leeway clause relativa a eventuais flutuações e divergências de capitais em riscos versus capitais seguros, o que permitirá ajustar o capital seguro na apólice à dinâmica do exercício económico da organização e, particularmente, ao ambiente macroeconómico em que esta compete (incluindo as atuais dificuldades ao nível das cadeias logísticas). 
 
Esta cláusula, que deve ser perspetivada como um complemento à revisão dos capitais seguros em perdas de exploração, possibilitará, até ao limite percentual contratado, o ajustamento do capital seguro, de forma a não existir uma situação de infrasseguro e ser aplicada a regra proporcional em caso de sinistro. 

É, também, recomendável uma revisão cautelosa por parte do segurado, dos períodos de indemnização garantidos via apólice de seguro, de modo a que seja assegurado o período necessário para reconstruir, reparar ou substituir os bens sinistrados, tendo em conta os atrasos decorrentes das atuais dificuldades nas cadeias logísticas. O mesmo se aplica aos respetivos capitais seguros.  

 

Seguros de Responsabilidade Civil – aumento dos custos de reparação dos danos 


No âmbito das apólices de Responsabilidade Civil estamos a assistir a um aumento dos custos de sinistros em resultado do incremento dos valores de indemnização dos danos a terceiros, explicados pela escalada dos preços de reparação. 

Face a este clima inflacionista, conjugado com o aumento da litigância, do alargamento do âmbito da responsabilidade civil, e a tendência de atribuição de valores de indemnização mais elevados, é aconselhável a revisão e adequação dos capitais contratados, de forma a que sejam adequados à exposição do risco de responsabilidade. De realçar que o capital constitui o valor máximo a indemnizar. Se os prejuízos/danos excederem este valor, a responsabilidade pelo excedente ficará a cargo do segurado. 

Em suma, mais importante do que resolver os problemas é antecipá-los. Se tiver em atenção os aspetos críticos mencionados, estarão criadas as condições para que o sinistro tenha uma resolução rápida e eficiente, não defraudando as expectativas e os direitos dos clientes, ao mesmo tempo que se materializa o papel fundamental do seguro como instrumento essencial para o desenvolvimento e sustentabilidade das sociedades. 

Na MDS estamos ao seu lado na proteção do seu mundo, com soluções que o protegem a si, aos seus bens e negócios.  


Por Pedro Pinhal e Nuno Rodrigues, Direção Técnica e Sinistro